quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

No país do desarmamento, as cadeias são pocilgas asquerosas que matam, mas o risco de morrer fora delas é ainda maior



É... antigamente, aconteciam coisas estarrecedoras no Brasil. Depois, a situação piorou um pouco. A manchete da Folha de hoje revela, sem dúvida, uma realidade vergonhosa: “Cadeias no Brasil têm um preso morto a cada dois dias”. Em 2013, foram 218 ocorrências. É claro que é um absurdo e que algo precisa ser feito. Mas e se eu provar pra vocês que, em boa parte dos estados brasileiros, é mais perigoso viver fora da cadeia do que dentro?




Postagem original no site da revista Veja, original aqui.

No país do desGoverno do #PT, é mais seguro DENTRO da cadeia???


Então vamos fazer as contas. Há, arredondando os números, 550 mil presos no Brasil. Se 218 foram assassinados no ano passado, isso corresponde a 39,63 assassinatos por 100 mil “habitantes dos presídios”. É claro que se trata de uma taxa escandalosa — sempre notando que as mortes são desigualmente distribuídas. No ano passado, só o Complexo de Pedrinhas, no Maranhão, respondeu por 28% do total.



Atenção, leitores! Abaixo, segue uma lista de estados brasileiros que têm uma taxa de homicídios superior ou igual, com variante depois da vírgula, à dos presídios brasileiros. O número que aparece entre parênteses é o de mortos por 100 mil habitantes. Todos os dados são do Anuário Brasileiro de Segurança Pública e dizem respeito a 2012:

- Alagoas (61,8)
- Bahia (40,7)
- Ceará (42,5)
- Pará (44,6)
- Paraíba (39,3)
- Sergipe (40)

E a realidade pode ser, acreditem, bem pior. Por quê? A população carcerária tem necessariamente mais de 18 anos — vale para quem mata e para quem morre. Se, cá fora, formos verificar a taxa de homicídios excluindo-se as pessoas abaixo dessa faixa etária, a base ficaria reduzida a mais ou menos 65%. Logo, a taxa de homicídios por 100 mil cresceria bastante.

Inclusive a brasileira. Segundo o anuário, em 2012, a taxa de homicídios no Brasil foi de 25,8 por 100 mil — tendo por base uma população estimada em 194 milhões. Se formos excluir a população abaixo de 18 anos, esses 194 milhões ficariam reduzidos a pouco mais de 126 milhões. Aí, meus caros, a taxa brasileira subiria de 25,8 por 100 mil para 39,7 — ligeiramente superior à dos presídios.

Mas esperem! Praticamente 100% dos mortos nos presídios são homens. Se formos excluir as mulheres da base de dados da população brasileira, aí a coisa assume proporção escandalosa. Fantasio? Não mesmo! Consultem o anuário. A taxa de homicídios por 100 mil de jovens na faixa entre 15 e 19 anos é de 45,7;entre 20 a 24, de 63,7; entre 25 a 29, de 54; entre 30 a 34, de 43,7 — todas elas superiores à taxa nos presídios. Reitero: a esmagadora maioria dos mortos é formada por homens, e a conta dos 100 mil habitantes inclui também as mulheres, o que acaba mascarando os números.

Assim, ainda que os presídios brasileiros sejam verdadeiras pocilgas; ainda que a vida por lá seja um inferno; ainda que se assista permanentemente a um show de horrores, a verdade é que os fatos, à luz da matemática, estão a nos dizer que, em muitos lugares do Brasil, é mais perigoso estar fora da cadeia do que dentro.

Nem poderia ser diferente. Em 2012, houve no Brasil 50.108 homicídios. É claro que a desgraça dos presídios deve nos constranger a todos; é claro que devemos cobrar uma resposta das autoridades. Mas é preciso deixar claro que, em certas faixas etárias, especialmente na população masculina, há um inferno ainda mais rigoroso fora das cadeias.

A campanha eleitoral está chegando. Quem vai se interessar pelo assunto? Daqui a pouco, começa aquele espetáculo virtual de amanhãs sorridentes na propaganda política.

A cada dois dias, morre assassinado um preso no Brasil. A cada dia, morrem assassinados 137 brasileiros fora das cadeias. E o que se ouve é apenas o silêncio cúmplice. O tema nem sequer está na agenda dos políticos.


Por Reinaldo Azevedo



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